sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Posterior

____________ Magno Aquino –


Me esvaziei
Da dor
De ser só,
Escapei, enfim
Saí
Culatra, tangente
Não sei,
Saí
Por uma das.
Teu rodear em mim
Polinizar,
Motivo de já não ser tão só.
Me esvaziei
De toda imensa dor
Pra repousar
Atado ao nome teu
Pois durmo
Já não só.
Pra ti cantei n’outras bocas
Pra te fazer dormir
Ao lado meu
Do outro lado seu
Aqui,
Da dor esvaziado.
Viro pro canto
Pra beijar tua boca
Demoradamente
Ao som do teu suor
À luz de vagalumes.
Me esvaziei da imensa dor
Pra receber
Tua completude em mim.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Tive fome,


 

Padecemos, pois muitos males afligem-nos; nós, a Igreja, por mania gastamos energia e tempo à procura de formas de gastarmos mais energia e tempo. Fazemos muito por muitas pessoas, mas nossas ações se diluem ao invés de nos concentrarmos e atacarmos um problema por vez.

Gasto tempo burilando a mente em busca de ideias que provoquem a fé e a disposição da Igreja; sonhamos fazer as "coisas grandes" e "as ainda maiores" ao mesmo tempo. Fui chamado pra cuidar de mendigos e obedeci; mesmo que pra isso tenha desobedecido a disposição superior de cuidar de uma igreja.

Entretanto, sofro do mesmo mal que assola-nos como igreja, "síndrome de onipresença"; outro dia li algo em Ultimato e em seguida, um flagrante xilique de onipresença me afligiu entre ser voluntário no Haiti ou evangelista em Cuba; (por telefone a Elê me mandou sossegar o facho, "Uma aflição missionário-geográfica absurda! O sertão baiano ta de bom tamanho.")

Exerço da melhor forma que aprendi o meu ofício: cuidar de mendigos no programa de recuperação da Missão vida. Haiti e Cuba sobreviverão sem mim.

Neste exato momento me encontro ao lado de uma maca de hospital público exercendo o meu ofício, oro e falo do amor de Deus enquanto troco fraldas e lençóis e checo o soro de um moço que a Missão Vida "teima em acolher e cuidar", quando até a assistência social e os médicos já sumiram.

Foi nesse conflito de pensar em coisas grandes ao mesmo tempo em que faço o urgente e necessário é que comecei a matutar sobre nós, a Igreja, fundada pelo sangue e sustentada pelo Espírito de Cristo Jesus. Sem dúvidas a fé sem obras é defunta tanto quanto o contrário disso não é Cristianismo; tudo quanto fizermos para promover o bem é louvável, mas toda ação social sem ação evangelística é só serviço.

Assistência social paliativa é prerrogativa do governo, que faz isso com uma incompetência apavorante (é apavorante ver um paciente cair da maca, bater com a cabeça e ficar ferido e nu naquele chão sujo até que eu me levante pra fazer algo, enquanto gente que deveria fazer algo assiste TV na sala ao lado).

Penso em nós, herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo, com nosso discurso acerca das ações em favor daqueles que não são ainda, herdeiros conosco; meu pensar é o pensar de um missionário membro do povo de Deus chamado metodista, povo que nasceu proclamando o "caráter social do Evangelho"; penso nas oportunidades que perdemos diariamente ali na porta.

Distribuímos cestas básicas na minha igreja, cuidamos de gente lá e quero dizer que me alegro com isso, mas preciso pensar se fazemos isso como serviço social, somente, ou se é por respondermos amorosamente aos ensinos de Jesus.

Paulo Rogério é crente em Jesus faz só um mês, (levantou a mão na pregação sobre Bartimeu) foi acolhido por nós e me disse que nunca ninguém fez por ele o que fazemos "e gostaria de ser da nossa família". (claro que não chorei na frente dele). Está dormindo agora; alimentado, agasalhado, a fralda e o lençol estão secos, e se sente seguro, (todas as vezes que abriu os olhos encontrou um de nós ao seu lado).

O moço que caiu é morador de rua, está numa maca quebrada, o lençol e a fralda estão sujos, faz frio aqui e certamente está com fome; chegou depois do mingau das dez.

De tanto matutar angustio-me, pois olhar ao redor me leva a pensar n'Aquele Dia quando nós, a Igreja, ouviremos: "Tive fome,sede, frio, estive enfermo e preso e, vocês fizeram mais que reuniões e discursos." Ouviremos?

A Igreja nunca conseguirá cuidar de toda a gente abandonada por aí; não tiraremos todos os moradores de rua das ruas, só tiraremos aqueles que quiserem vir conosco, e só cuidaremos daqueles que aceitarem os nossos cuidados.

Muitos ouviram falar sobre a "nova vocação da igreja", vocação social! Só que, as boas obras de antemão preparadas para que nelas andemos, eu me recuso identificá-las como uma nova vocação. O Evangelho social foi "inaugurado" antes mesmo do calvário. Nas bodas de Caná, na multiplicação dos pães, na ressurreição do filho da viúva, Jesus fez mais "que sinais, milagres e prodígios", Jesus assistiu aquelas pessoas.

A nossa seminal vocação é social, somos a agência de transformação partindo das boas novas. Sal da Terra e Luz do Mundo! Creio nisso, da mesma forma que entendo que as boas obras e os atos honrosos são inerentes ao corpo de Cristo, privilégio dos santos.

Não salvaremos todo mundo da miséria, dos vícios e da condenação, mas como instrumentos, abrimos mão de muitas coisas pra trabalharmos todos os dias em favor dos que aceitarem a nossa ajuda; como crente e missionário, isso afirmo.

O funcionário que indaguei sobre uma maca com grades, lençóis e fraldas secas e alguém pra dar uma olhada na cabeça do moço que caiu, disse que "isso não é assunto meu."

De manhã durante o trajeto de volta à base da Missão Vida eu pensei assim: "Aquele sujeito ta errado, "gente desse tipo" é e sempre será assunto meu, e da Igreja, sim senhor." E você, pensa o quê?


 

Missão Vida. Porque eu amo gente!